Sou estudante do Curso de Estudos Eslavos da Faculdade de Letras de Lisboa e decidi criar este blogue, porque em Portugal, ainda se conhece pouco dos países eslavos. A minha ideia, é a criação de um espaço aberto à divulgação, à troca de informações, de experiências e ideias de tão belos países.
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14 de abril de 2010

Fiodor Dostoievsky - III Parte

Em 1864, conseguiu editar com seu irmão o jornal chamado “Epoja” (Época), onde publicou “Memórias do Subsolo”. O seu entusiasmo acabou após a morte da sua esposa, seguida pouco depois pela de seu irmão. Além disso, seu irmão Mikhail deixou uma viúva, quatro filhos e uma dívida de 25 mil rublos, tendo Dostoievsky de sustentá-los. Profundamente depressivo e viciado em jogos, acumulou enormes dívidas. Para sanar os seus problemas financeiros, fugiu para o estrangeiro, onde perdeu o restante do dinheiro que ganhara em casinos. Ali reencontrou-se com Paulina Súslova e tentou reatar o relacionamento, mas foi rejeitado.

Em 1865 começou a elaborar “Crime e Castigo”, uma das suas obras capitais, que apareceu na revista “O Mensageiro Russo”, com grande sucesso. Quando o seu editor determinou um curto prazo para que terminasse o livro, contratou Anna Grigórievna Snítkina, na época com vinte e quatro anos, a quem dedicou, em apenas vinte e seis dias, o livro “O Jogador”.O relacionamento com Anna finalmente terminou em casamento a 15 de Fevereiro de 1867.

Juntos continuaram a viajar pela Europa e em Genebra, nasceu e morreu pouco tempo depois a sua primeira filha. Em 1868 escreveu “O Idiota” e, em 1871, terminou “Os Demónios”, publicado no ano seguinte. A partir de 1873 publicou no jornal “Diário de um Escritor”, que escreveu sozinho, compilando histórias curtas, artigos políticos e críticas literárias, obtendo grande sucesso. Esta publicação seria interrompida em 1878, para dar início à elaboração do seu último romance, “Os Irmãos Karamazov”, que foi publicado em grande parte no jornal russo “O Mensageiro”.

Em 1880 participou na inauguração do monumento a Aleksandr Pushkin em Moscovo, onde proferiu um discurso memorável sobre o destino da Rússia no mundo. A 8 de Novembro desse ano, termina “Os Irmãos Karamazov”, em São Petersburgo. Morreu nesta cidade, a 9 de Fevereiro de 1881, de uma hemorragia pulmonar associada com enfisema e um ataque epiléptico. Foi enterrado no Cemitério Tijvin, dentro do mosteiro de Alexander Nevsky, em São Petersburgo. Estima-se que o funeral foi assistido por cerca de sessenta mil pessoas. Na sua lápide podem ler-se versos do Apóstolo São João, que também serviu como subtítulo de seu último romance, “Os Irmãos Karamazov”:
Na verdade, na verdade vos digo que, se o grão de trigo, caindo na terra, não morrer, fica ele só; mas se morrer, dá muito fruto” – Evangelho segundo João, 12:24
Estilo
Dostoievsky necessitava de dinheiro e fora sempre apressado em concluir as suas obras, por isso dizia que não conseguia realizar o seu pleno poder literário. Mais tarde, por saber bem o que as seguintes palavras significavam, disse: “A pobreza e a miséria formam o artista”. Embora a frase pareça abrangente e generalizada, Fiódor costumou desviar-se do estilo de escritores que descreviam o círculo da família moldados na tradição e nas "belas formas", e engendrou no caos familiar os que humilhavam e insultavam. Essencialmente um escritor de mitos (e às vezes comparado por isso a Herman Melville), criou um trabalho com uma enorme vitalidade e de um poder quase hipnótico, caracterizado por cenas febris e dramáticas, onde os personagens apresentam um comportamento escandaloso, e atmosferas explosivas, envolvidas em diálogos socráticos apaixonados, a busca de Deus, do mal e do sofrimento dos inocentes.

Os seus romances são escritos num período bastante curto (por vezes apenas em alguns dias), o que permite ao autor fugir de uma das características dominantes da prosa realista: a degradação física que ocorre ao longo do tempo. As suas personagens encarnam valores espirituais que são, por definição, atemporais. Outros temas recorrentes na sua obra são o suicídio, o orgulho ferido, a destruição dos valores familiares, o renascimento espiritual através do sofrimento, a rejeição do Ocidente e da afirmação da ortodoxia russa e o czarismo. Estudiosos como Mikhail Bajtín têm caracterizado o trabalho de Dostoievsky como diferente de outros romancistas; ele parece não aspirar por uma visão única e vai além da descrição sob diferentes ângulos. Dostoievsky construiu romances cheios de força dramática em que os personagens e os opostos pontos de vista são realizados livremente, em violenta dinâmica.

O espaço e o tempo em Dostoievsky é analisado às vezes como “discreto, onde o inesperado não apenas é possível como também sempre se realiza”. Certos autores comparam o tempo e o espaço em Dostoievsky como cenas cinematográficas: o uso constante da palavra russa vdrug (de repente), que aparece 560 vezes na edição russa de “Crime e Castigo”, tem a proposta de levar ao leitor a impressão de tensão, de desigualdade e de nervosismo, elementos característicos da estrutura das suas obras. Além da palavra vdrug em “Crime e Castigo”, a sua literatura utiliza muito os números, às vezes usando-os com uma extrema precisão: a dois passos...., duas ruas a direita, como também usa números elevados e redondos (100, 1000, 10000). Acredita-se que esses elementos são "mito-poéticos": “Crime e Castigo” possui sete partes (6 partes e o epílogo), sendo que, na composição do romance, ele é dividido em 7 capítulos (cada parte), e a "hora fatídica" é indicada como depois das 7. O processo de evolução da humanidade dá-se exclusivamente pela repetição de dificuldades e ocasiões, e também pelo uso da memória e da lembrança, por mais infernal que tudo isso possa parecer ao personagem.

Dostoievsky publicou inúmeros contos: “O Mujique Marëi”, “O Sonho de um Homem Ridículo”, “Bobock” e outros, além de novelas: “O Senhor Prokhartchin”, “A Dócil”, “O Homem Debaixo da Cama”, “Uma História Suja”, “O Pequeno Herói”, “Uma Criatura Gentil”, “Coração Fraco” e “Noites Brancas”. Criou duas revistas literárias: Tempo e Época, colaborando ainda nos principais órgãos da imprensa russa.
Personagens
Provavelmente foi muito influenciado por tradições folclóricas. Algumas acreditavam que as águas de rios, mares e lagos representavam a fronteira entre o mundo dos vivos e o mundo dos mortos. Geograficamente, além do rio Neva, na Rússia, coexistem outros meios aquáticos, e por conta disso a cidade de São Petersburgo tornou-se fantástica e diabólica, o que influenciou a cultura popular e a literatura russa, sobretudo Dostoievsky.

Por consequência da influência que arrecadou através dessa cultura – onde o Homem está entre a vida e a morte – as personagens da sua literatura estão constantemente expostas a ocasiões complexas, nos limites da razão e da lógica, e naquilo que o ser humano é capaz de realizar diante de problemas universais; contudo, em geral, as personagens podem ser classificados em diferentes categorias: cristãos humildes e modestos (Príncipe Mishkin, Sonia Marmeládova, Aliosha Karamazov), autodestrutivos e niilistas (Svidrigáilov, Smerdiakov, Stavroguin, Maslobóiev), cínicos e libertinos (Fiódor Karamazov, Prince Valkorskij), intelectuais rebeldes (Rodion Romanovitch Raskólnikov, Ivan Karamazov), enquanto regidos por ideias e não por imperativos sociais ou biológicos.

Legado e influência
O russo Alexey Rémizov durante exílio em Paris, em 1927, escreveu: "A Rússia é Dostoievsky. Rússia não existe sem Dostoievsky”. A maioria dos críticos concorda que Dostoievsky, Dante Alighieri, William Shakespeare, Miguel de Cervantes, Victor Hugo e poucos outros escolhidos tiveram uma influência tão decisiva sobre a literatura do século XX, especialmente no existencialismo e expressionismo.

A influência de Dostoievsky é imensa, de Hermann Hesse a Marcel Proust, William Faulkner, Albert Camus, Franz Kafka, Yukio Mishima, Roberto Arlt, Ernesto Sabato e Gabriel García Márquez, para citar alguns autores. Na verdade, nenhum dos grandes escritores do século XX foram alheios ao seu trabalho (com algumas raras excepções, tais como Vladimir Nabokov, Henry James ou D.H. Lawrence). O romancista americano Ernest Hemingway também citou Dostoievsky numa das suas últimas entrevistas como uma das suas principais influências.

Nietzsche referiu-se a Dostoievsky como “o único psicólogo com que tenho algo a aprender: ele pertence às inesperadas felicidades da minha vida, até mesmo na descoberta de Stendhal”. Certa vez disse, referindo a “Notas do Subsolo”: “Chorei verdade a partir do sangue”. Nietzsche refere-se constantemente a Dostoievsky nas suas notas e rascunhos no internato entre 1886 e 1887, além de escrever diversos resumos das obras de Dostoievsky. “Um grande catalisador: Nietzsche e neo-idealismo russo”, disse Mihajlo Mihajlov.

Com a publicação de “Crime e Castigo” em 1866, Fiódor tornou-se num dos mais proeminentes escritores russos do século XIX, tido como um dos fundadores do movimento filosófico conhecido como existencialismo. Em particular, “Memórias do Subsolo”, publicado pela primeira vez em 1864, tem sido descrito como o trabalho fundador do existencialismo. Para Dostoievsky “A guerra é a revolta do povo contra a ideia de que a razão orienta tudo”.
Bibliografia
A Senhoria
O Adolescente
Aldeia de Stiepantchikov e os seus Habitantes
Crime e Castigo
Dnevnik pisatelya
O Eterno Marido
Gente Pobre
Humilhados e Ofendidos
O Idiota
Os Irmãos Karamazov
Netochka Nezvanova
Niétotchka Niezvanova
Noites Brancas
Notas do Subterrâneo
O Duplo
O Jogador
O Pequeno Herói
Os Demónios
Recordações da Casa dos Mortos

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