Sou estudante do Curso de Estudos Eslavos da Faculdade de Letras de Lisboa e decidi criar este blogue, porque em Portugal, ainda se conhece pouco dos países eslavos. A minha ideia, é a criação de um espaço aberto à divulgação, à troca de informações, de experiências e ideias de tão belos países.
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13 de abril de 2010

Fiodor Mikhailovich Dostoievsky - Фёдор Миха́йлович Достое́вский - I Parte

Uma vez que tenho vindo a apresentar alguns escritores eslavos, não poderia deixar de apresentar um dos maiores (e o meu preferido) Dostoievsky.


Fiódor Dostoiévski, fotografado em 1879


Fiodor Mikhailovich Dostoievsky (Фёдор Миха́йлович Достое́вский) nasceu em Moscovo, a 11 de Novembro de 1821 e faleceu em São Petersburgo, a 9 de Fevereiro de 1881 e é um dos mais famosos escritores russos e dos maiores inovadores artistas de todos os tempos.

É tido como o fundador do existencialismo, concretamente com a sua obra “Notas do Subterrâneo”, descrito por Walter Kaufmann como a “melhor proposta para existencialismo já escrita”.

A sua obra explora a autodestruição, a humilhação e o assassínio, além de analisar estados patológicos que levam ao suicídio, à loucura e ao homicídio: a sua escrita é chamada por isso de “romances de ideias”, pela retractação filosófica e atemporal dessas situações. O modernismo literário e várias escolas de teologia e psicologia foram influenciadas pelas suas ideias.

Dostoievski, aos 17 anos, teve uma grande crise de epilepsia após saber que o seu pai tinha sido assassinado e deixou o exército cinco anos depois para dedicar-se integralmente à actividade literária. Dostoievsky passou a afastar-se das armas, mas acabou por envolver-se em conspirações revolucionárias, das quais passou pela prisão e pela condenação de morte, embora a pena tenha sido anulada. Alguns autores acreditam que essas dificuldades pessoais o ajudaram a afirmar-se como um dos maiores romancistas do mundo, mas de facto o seu reconhecimento como “escritor universal” só se verificou após 1860, com a publicação dos seus grandes romances: “O Idiota” e “Crime e Castigo”, este publicado em 1866, considerado por muitos como uma das mais famosas obras da literatura mundial.

O seu último romance, “Os Irmãos Karamazov”, foi considerado por Sigmund Freud como o melhor romance já escrito. Segundo o biógrafo Nicholas Berdiaiev, a obra de Dostoievsky é marcada pelo anticapitalismo, por uma reacção ao capitalismo selvagem, algo que parece tocar o leitor hoje”. A obra de Dostoievski exerce uma grande influência no romance moderno, legando-lhe um estilo caótico, desordenado e que apresenta uma realidade alucinada.


Primeiros anos
Fiódor foi o segundo dos sete filhos nascidos do casamento entre Mikhail Dostoyevski e Maria Fedorovna. Mikhail era um pai autoritário, médico no Hospital de pobres Mariinski, em Moscovo e a mãe era vista pelos filhos como um paraíso de amor e de protecção do ambiente familiar. Até 1833, Fiódor foi educado em casa, mas com a morte precoce da sua mãe por tuberculose em 1837 e a decorrente depressão e alcoolismo do pai, foi conduzido, com o irmão Fiódor Mikhail, à Escola Militar de Engenharia de São Petersburgo, onde começou a demonstrar interesse pela Literatura.

Em 1839, quando tinha dezoito anos, recebeu a notícia da morte do seu pai. Hoje é aceite, porém sem provas concretas, que o seu pai, foi assassinado pelos próprios servos na sua propriedade rural em Daravói, indignados com os maus tratos sofridos. Tal facto exerceu uma enorme influência sobre o futuro do jovem Fiódor, que desejou impetuosamente a morte do seu progenitor e em contrapartida se culpou por isso, facto que motivou Freud a escrever o polémico artigo “Dostoievsky e o Parricídio”.

Dostoievsky sofria de epilepsia e o seu primeiro ataque ocorreu quando tinha apenas nove anos. As suas experiências epilépticas serviram-lhe de base para a descrição de alguns dos seus personagens, como o príncipe Myshkin no romance “O idiota”, e de Smerdyakov na obra “Os Irmãos Karamazov”.

Início da carreira literária
Na Academia Militar de Engenharia, em São Petersburgo, Dostoievsky aprendeu matemática, uma disciplina que desprezava. Também estudou Shakespeare, Pascal, Victor Hugo e Hoffmann. Nesse mesmo ano, escreveu duas peças românticas, “Mary Stuart” e “Boris Godunov”, influenciado pelo poeta romântico alemão Friedrich Schiller. Dostoievsky descrevia-se como um "sonhador" na sua juventude e, em seguida, como um admirador de Schiller.

Em 1843, terminou os seus estudos de engenharia e adquiriu a patente de Tenente Militar, ingressando na Direcção-Geral dos Engenheiros, em São Petersburgo.

Em 1844, Honoré de Balzac visito-o em São Petersburgo, e Dostoievsky, como forma de admiração, fez a sua primeira tradução, “Eugenia Grandet” e saldou uma dívida de 300 rublos com um agiota. Esta tradução despertou a sua vocação, levando-o pouco tempo depois a abandonar o exército para dedicar-se exclusivamente à literatura. Trabalhou como desenhista técnico no Ministério da Guerra, em São Petersburgo. Também traduziu para Balzac e George Sand.

Alugou, em 1844, uma casa em São Petersburgo e dedicou-se à escrita de corpo e alma. Nesse mesmo ano, deixou o exército e começou a escrever sua primeira obra, o romance epistolar “Gente Pobre” trabalho que iria fornecer-lhe êxitos segundo a crítica literária, cuja leitura de Bielínski, o mais influente crítico da literatura russa, o fez acreditar ser Dostoievsky “a mais nova revelação do cenário literário do país”.

Segundo várias fontes, consta que quando escreveu “Diário de um Escritor” deu uma cópia para o seu amigo Dmitry Grigorovich, que a entregou ao poeta Nikolai Alekseevich Nekrasov. Com a leitura do manuscrito em voz alta, ambos ficaram extasiados pela percepção psicológica da obra. Às quatro horas da manhã, foram ter com Dostoievsky para lhe dizer que o seu primeiro romance era uma obra-prima. Nekrasov mais tarde entregou a obra a Bielínski. "Um novo Gogol apareceu!", disse Nekrasov. "Contigo, a primavera de Gogol nasce como cogumelos!". Bielínski respondeu a Dostoievsky.

"Saí da casa dele (Bielínski) em estado de êxtase. Parei por um instante na esquina da sua casa, olhei para o céu, para o luminoso sol , para as pessoas que passavam, e compreendi, no mais fundo do meu ser, que aquele tinha sido um momento solene na minha vida, um marco decisivo, que alguma coisa inteiramente nova havia começado". – Dostoievsky sobre as palavras de Bielínski, no “Diário de um Escritor

O livro foi publicado no ano seguinte, fazendo de Dostoievsky uma celebridade literária aos vinte e quatro anos de idade. Ao mesmo tempo, começou a contrair algumas dívidas e a sofrer de ataques epilépticos com mais frequência. Os seus romances seguintes, “Duas vezes” de 1846 e “Noites Brancas” de 1848, retratam a mentalidade de um sonhador, “Niétochka Nezvánova” de 1849 e “Inveja do Marido” e “Esposa de Outro”, não tiveram o êxito esperado, e sofreram críticas muito negativas, que fizeram com que Dostoievsky mergulhasse em profunda depressão. Nesta época entrou em contacto com alguns grupos de ideias utópicas, que procuravam a liberdade humana.


Exílio na Sibéria
Dostoievsky foi detido e preso a 23 de Abril de 1849 por participar num grupo intelectual liberal, sob acusação de conspirar contra o Nicolau I da Rússia. Depois das revoluções de 1848, na Europa, Nicolau mostrou-se relutante a qualquer organização clandestina que poderia pôr em risco sua autocracia.

Dostoievsky passou oito meses na prisão até que, em 22 de Dezembro, a sentença de morte por fuzilamento foi anunciada. Dostoievsky teve de situar-se em frente ao pelotão de fuzilamento com uma venda e até mesmo ouvir os seus disparos. No último momento, as armas foram baixadas e um mensageiro trouxe a informação de que czar havia decidido poupar a vida do escritor. A sua pena foi trocada por cinco anos de trabalhos forçados em Omsk, na Sibéria.

O príncipe Myshkin, de “O Idiota”, oferece várias descrições sobre essa mesma experiência. Após a simulação da execução, Fiódor passou a apreciar o próprio processo da vida como um dom incomparável e, ao contrário do determinismo e do pensamento materialista, o valor da liberdade, integridade e responsabilidade individual.

Durante esta altura, os ataques epilépticos aumentaram. Anos mais tarde, Dostoievsky descreveu o seu sofrimento ao seu ao irmão, dizendo que se sentia “um silenciado num caixão” e que o local onde estava “deveria já ter sido demolido à muitos anos”.

No verão, um confinamento intolerável, no inverno, um frio insuportável. Todos os pisos estavam podres. A sujidade no chão tinha uma polegada de espessura; alguém poderia tropeçar e cair… Éramos empilhados como anéis de um barril… Nem sequer havia um lugar para andar… Era impossível não nos comportarmos como suínos, desde o amanhecer até o pôr-do-sol. Pulgas, piolhos…” – Dostoievsky sobre o seu local na prisão.

Foi libertado em 1854 e condenado a quatro anos de serviço no Sétimo Batalhão, na fortaleza de Semipalatinsk, no Cazaquistão, além de soldado por tempo indeterminado. Apaixona-se por Maria Dimítrievna Issáievna, mulher de um conhecido. Com a morte do marido e já no ano seguinte, em Fevereiro de 1857, casam-se. Na noite de núpcias Dostoievsky sofreu uma violenta crise de epilepsia.
(continua)

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